Escritos Pornográficos

“Nos meus cadernos escolares / Na minha carteira e nas árvores / Na areia e na neve / Escrevo o teu nome”. Começa assim Liberdade, o famoso poema de Paul Éluard, parodiado por Boris Vian num poema homónimo incluído nestes Escritos Pornográficos: “Vim na noite / Conspurcar tudo isso / Vim pelo teu nome / Para o escrever / Com esperma.” É um aviso ao leitor de espírito menos casto que veja no título uma simples promessa de viagra literário. A rebeldia e o humor do multifacetado Vian manifestam-se nesse e noutros poemas em que sugere uma utilização não-culinária do pepino, celebra as herdeiras de Safo como objectos do desejo masculino, expõe as palpitações lúbricas que se ocultam debaixo das batinas eclesiásticas e estuda a anatomia feminina como ameaça à integridade do membro viril.

 

Embora o interesse de Vian pela literatura erótica fosse superficial, como comprovado pela magreza do volume que reúne a sua produção literária dentro do género, isso não o impediu de reflectir sobre o tema. Utilidade de uma Literatura Pornográfica, conferência proferida pelo autor em 1948 e que abre este livro, é uma tentativa de definição da literatura erótica. O ensaio não é muito profundo, embora seja interessante observar como Vian arruma Sade na filosofia (e não na literatura) erótica e Henry Miller na literatura médica. A curiosa conclusão, que “não há literatura erótica senão no espírito do erotómano” (p. 42), obrigaria cada leitor ao extenuante exercício de contar as erecções provocadas por um livro antes de o poder classificar como erótico.

 

O conjunto de textos, publicado em 1980, vinte anos após a morte do escritor, encerra com uma variação do mito de Drácula, rebaptizado na versão de Vian com o pouco subtil nome de Drencule. É o texto mais explícito da recolha, um delírio onírico de hermafroditismo vampiresco e com descrições de práticas muito populares em Sodoma, pelo que se aconselha a arrumação do livro em local inacessível a crianças e a pessoas com problemas cardíacos.

 

publicado por Bruno Vieira Amaral às 17:49
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