Três Mulheres Poderosas

A escritora francesa Maria Ndiaye conquistou o prémio Goncourt com este romance sobre três mulheres inadaptadas, porém suficientemente fortes para não soçobrarem perante as adversidades.

 

De acordo com a velha máxima, por trás de um grande homem há sempre uma grande mulher. Neste romance, em que mesmo os homens fortes são fracos, há sempre uma mulher que resiste, que teima em não definhar na sombra. As três mulheres poderosas, cujas vidas estão superficialmente ligadas, lutam todas contra o mesmo. Norah luta contra a figura de um pai ausente mas opressivo. Fanta usa o silêncio para combater um marido que a arrastou para o seu próprio falhanço. Khady Demba enfrenta a memória do marido morto ao qual não conseguiu dar descendentes. Como viveram sempre em função das expectativas masculinas, desenvolveram a arte de lhes suportar o peso sem perder de vista a própria identidade. Esse peso, e o sofrimento que dele resulta, é mais um teste à capacidade de adaptação do que à capacidade de resistência. E Norah, Fanta e Khady encontram sempre maneira de se adaptarem, de encontrar um lugar, por mais frio, triste ou infecto, que seja só delas. A força destas mulheres é o seu verdadeiro dote, o objecto da cobiça masculina. Como se fossem portadoras de um bem sem o qual toda a fraqueza masculina ficaria exposta, a exemplo do que acontece ao marido que, “a pretexto de a amar, fechara Fanta numa prisão de amor lúgubre e fria.”

 

A prosa de Marie Ndiaye espraia-se por frases longas e ricas em adjectivos que se encadeiam harmoniosamente para atingir uma descrição exaustiva, mas não cansativa, dos estados emocionais das personagens. Emoções que são potenciadas pelas características dos locais onde a acção decorre: da casa despovoada do pai de Norah à sala asfixiante onde Khady Demba vende o corpo, da modorra da província francesa às ruas agitadas de uma cidade africana. Tal como as personagens femininas, resistentes mas flexíveis, a escrita de Marie Ndiaye move-se com igual presteza por esses mundos opostos sem abdicar da sua integridade. Como se a obra, embora dividida entre Europa e África, feminino e masculino, pertencesse antes de mais ao artista, esse ser que habita nas intersecções.

publicado por Bruno Vieira Amaral às 18:50
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